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segunda-feira, 2 de março de 2015

SC: Equipe de Auditores-Fiscais flagra situação degradante de apanhadores de aves em Forquilhinha


Banheiro não tinha chuveiro para os trabalhadores
Trabalhadores e suas famílias foram aliciados no Paraná e viviam em alojamento em condições precárias. Apanhadores de aves prestavam serviços para a JBS 
Uma ação fiscal foi realizada em Forquilhinha (SC) nos dias 24 e 25 de fevereiro, motivada por denúncia apresentada por uma jornalista da região de Criciúma no dia 23, sobre condições precárias de trabalhadores no município. A ação foi organizada rapidamente pela Coordenação de Fiscalização Rural da Superintendência Regional do Trabalho e Emprego de Santa Catarina – SRTE/SC, para fazer o flagrante. 
A coordenadora Lilian Carlota Rezende conta que na manhã do dia 24 já havia uma matéria publicada no Jornal da Manhã, de Criciúma, com a notícia de que havia em Forquilhinha trabalhadores aliciados no Paraná e alojados em condições degradantes de habitação, que prestavam serviços para o frigorífico JBS. A reportagem informava que a JBS, procurada, comunicou que o contrato com a empresa terceirizada foi iniciado em 16 de fevereiro e que estaria verificando as denúncias. 
O grupo econômico JBS adquiriu, recentemente, vários frigoríficos de aves da região Sul do Estado de Santa Catarina, sendo um deles a empresa Agrovêneto, de Nova Veneza, e outro a empresa Seara, de Forquilhinha, cidades do entorno de Criciúma. 
Lilian informa que a Agrovêneto e a Seara já foram fiscalizadas, especialmente nas condições de trabalho e emprego dos trabalhadores da "apanha" de aves vivas, “atividade que sempre se deu de forma muito precária, e que, apesar de fazer parte do processo produtivo do frigorífico, e apesar de ser controlada pelo frigorífico quando este define a escala de trabalho, teve a melhoria de suas condições na modalidade contratação interposta, motivo pelo qual os órgãos de proteção do trabalhador, como o Ministério do Trabalho, Ministério Público do Trabalho e Judiciário passaram a aceitar esta ‘terceirização’”. 
Com o passar do tempo, entretanto, a máscara da contratação interposta caiu. Na medida em que as empresas prestadoras foram fiscalizadas em outras ocasiões, foi constatado  que a real interessada, a empresa frigorífica, não pagava o suficiente para que as prestadoras cumprissem as normas de proteção aos trabalhadores. 
Em meados de 2013 foi realizada uma fiscalização nas atividades de "apanha" de aves vivas da empresa Agrovêneto e em seus prestadores de serviços, e mais especificamente no prestador Ernesto Sperfeld, a pedido do Ministério Público do Trabalho em Criciúma. 
Desalentados com as poucas condições de trabalho e a baixa remuneração, os prestadores de serviço relataram as reais condições de trabalho: que os contratos não eram feitos entre produtor e prestadora, mas todos tinham origem na indústria e que a indústria tinha planilha dos gastos e definia os preços pagos, mas que não eram suficientes para cumprir as exigências trabalhistas. Como resultado desta ação foram interditados dois ônibus de transporte de trabalhadores e a relação de emprego entre estes empregados foi estabelecida com a JBS, recente adquirente da Agrovêneto. 
Com base no relatório desta ação fiscal o Ministério Público do Trabalho em Criciúma ingressou com Ação Civil Pública contra a JBS, no sentido de melhorar as condições de trabalho dos empregados da "apanha", e primarizar a atividade. 
Em razão deste contexto, Lilian Carlota diz que a denúncia causou estranheza, mas a ação foi organizada em razão da origem da denúncia, que partiu de uma jornalista da região. 
Alojamento
Os Auditores-Fiscais foram acompanhados de um procurador do Trabalho e chegaram ao local do alojamento com a ajuda da denunciante. O local é uma estrutura administrativa e de apoio de pessoal pertencente à Cooperminas - Cooperativa de Extração de Carnaval Mineral. 
Os representantes da Cooperminas compareceram ao local e apresentaram cópia do contrato de aluguel com a DI Serviços de Carga e Descarga Eirele. O contrato, firmado em 4 de fevereiro, não tem valor estipulado e nenhuma contraprestação está definida. O espaço foi alugado como sendo de salas comerciais, mas, de fato, já foi e continua sendo ocupado como alojamento para trabalhadores. 
Nas entrevistas realizadas pelos Auditores-Fiscais, os trabalhadores informaram que vieram de Santa Izabel do Oeste, no Paraná, e chegaram ao alojamento em 4 de fevereiro. Desde o início prestaram serviços de apanha de ave viva, sempre em benefício da JBS Aves. Eles eram levados de van por de 12h30 e retornavam, geralmente, à meia noite, mas houve dias em que chegaram a retornar às três horas da madrugada. 
Os empregados disseram que já trabalhavam para o aliciador no Paraná e que o contrato foi encerrado. Alguns vieram com esposa e filhos. Em Forquilhinha eles ainda não haviam sido submetidos aos exames médicos de admissão, não assinavam controle de jornada. A promessa foi de receber um salário de R$ 1.230,00 por mês e eles já tinham recebidos "vales". Foram feitos "convênios" com os supermercados próximos e, assim, eles poderiam adquirir mantimentos. Mas, até este momento, o aliciador forneceu os mantimentos e prometeu não descontar os valores dos seus salários. 
Lilian afirma que “a situação física encontrada no local não pode ser descrita em palavras, ou mesmo nas fotos que tiramos, porque no local havia muitas moscas e mau cheiro. Ficou claro que os colchões, podres em sua maioria, não foram fornecidos nem pelo empregador (JBS) nem pelo aliciador, e que não havia pessoa contratada para fazer a limpeza do local”. Ela observa que devido às condições da construção, bastante deteriorada, seria muito difícil manter o local limpo. Havia portas e paredes quebradas e outros problemas de construção civil. 
Havia botijão de gás dentro da casa e na mesma cozinha eram colocados colchões no chão à noite, onde dormiam a sogra e a tia da cozinheira. Esta, por sua vez, dormia em outro cômodo com o marido. Um dos banheiros não tinha chuveiro; o outro estava com a pia quebrada. Em outros cômodos foram distribuídos casais e famílias, e havia uma mulher grávida, que foi retirada do local depois da primeira visita dos jornalistas ao alojamento. 
Transporte irregular
As duas vans que faziam o transporte dos trabalhadores foram alteradas em sua estrutura de fábrica para acondicionar um trilho usado no momento do transporte das caixas de frangos vivos para o caminhão. Esta alteração não autorizada pelas autoridades de trânsito e pode aumentar significativamente a possibilidade de escoriações e mesmo morte em um eventual acidente de trânsito. Havia problemas também com a documentação dos motoristas e, por essa razão, as chave das vans foram apreendidas e somente devolvidas ao  representante legal da empresa no momento da assinatura do Termo de Interdição dos veículos. 
Na JBS
A equipe de Auditores-Fiscais também esteve na sede da JBS Aves, em Nova Veneza, e solicitou a cópia do contrato de prestação de serviços da JBS com a DI Serviços de Carga e Descarga Eireli EPP. Os representantes da empresa, inicialmente, disseram que se tratava de contrato entre a Seara Alimentos Ltda e a DI, e que a Seara, apesar de ter sido adquirida pela JBS, tinha o administrativo em Forquilhinha. 
Eles foram advertidos de que a não apresentação do documento poderia implicar na autuação por não esclarecimento das situações ou pela presunção de que a empresa não tinha o documento formalizado. Somente depois de uma hora o contrato foi apresentado, com data posterior ao início da prestação de serviços dos trabalhadores. 
Segundo Lilian Carlota, esta primeira visita foi encerrada com a Determinação das Medidas de Resgate dos trabalhadores. Foi determinada, entre outras, a retirada dos empregados do alojamento e a apresentação de empregados e documentos na manhã do dia seguinte, 25 de fevereiro. A JBS terá que pagar os direitos dos trabalhadores. 
Na mídia
A ação fiscal foi acompanhada por jornalistas que produziram matérias sobre a situação encontrada e que foram reproduzidas por dezenas de sites. Veja matéria do G1 Santa Catarina. e do EcoDebate
Leia também a matéria do Jornal da Manhã de Criciúma (página 7), publicada no dia 24 de fevereiro

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