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A legislação, que alterou a CLT, diz que o uso de celular ou e-mail para contato entre empresas e funcionários equivalem, para fins jurídicos, às ordens dadas diretamente aos empregados, e isso pode se constituir em recebimento de hora extra quando essas atividades se desenvolverem fora do expediente. Por outro lado, a CNI (Confederação Nacional da Indústria), acha que o objetivo do projeto de lei do deputado Eduardo Valente, de 2004, que deu origem à mudança da CLT, era somente regular o trabalho à distância.
A questão envolve uma escalada de stress para pessoas que usam de forma obsessiva os emails e celulares. Abaixo, artigo publicado na Folha de São Paulo de hoje (03/01/2013) e que vale a pena ser lida pelos profissionais do SESMT (NR-4).
Transcrito da Folha de São Paulo, que traduziu publicação do New York Times
Nos EUA, empresas tentam reduzir uso de e-mail e celular
Tania Mohn (New York Times)
Nesta época do ano, resoluções quanto a mudança de comportamento são comuns, mas em geral envolvem fumar menos e malhar mais. Agora, algumas empresas estão adotando normas cujo objetivo é estimular seus funcionários a reduzirem o uso de aparelhos eletrônicos.
A Atos, uma companhia internacional de informática, planeja eliminar o uso de e-mails entre seus funcionários até o final de 2013, substituindo-os pela comunicação pessoal. E a partir do ano que vem os funcionários da montadora de automóveis alemã Daimler terão as mensagens de e-mail que recebem durante as férias apagadas automaticamente, para que não recebam um dilúvio delas quando retornam. Uma mensagem temporária informará que outro funcionário está encarregado de responder às questões de trabalho do colega em férias.
Pessoa alguma deveria estar “ligada” 24 horas por dia, e “desconectar” e preservar o repouso depois do trabalho é importante, “mesmo em meio a uma viagem de negócios”, disse Sabrina Schrimpf, porta-voz da Daimler, em referência a um relatório que a empresa divulgou recentemente e no qual propõe reconciliar a vida pessoal e a vida profissional de sua equipe. A desconexão pode ser mais difícil para profissionais que viajam a negócios, enfrentam diferenças de fusos horários e trabalham jornadas longas.
E essas situações se espalham pela empresa, diz Leslie Perlow, professora de liderança na escola de administração de empresas da Universidade Harvard e autora de um livro sobre o uso exagerado de celulares inteligentes. “São pessoas que voam no meio da noite e enviam mensagens a seus colegas”, que por sua vez esperam acordados, prontos para responder.
Um estudo conduzido no segundo trimestre de 2012 pelo Pew Research Center constatou que embora os celulares inteligentes sejam vistos como forma de manter a produtividade, estar acessível o tempo todo tem seu lado negativo. Uma pesquisa de alcance nacional envolvendo 2.254 adultos nos Estados Unidos constatou que 44% dos proprietários de celulares dormem com eles na mesa de cabeceira, e que 67% tiveram a experiência de “chamadas fantasma”, a impressão de que o aparelho está tocando ou vibrando mesmo que não seja esse o caso. Mas a proporção de proprietários de celulares inteligentes que declaram poder viver sem eles subiu de 29% em 2006 a 37% na pesquisa mais recente.
Sam Chapman, presidente-executivo da Empower Public Relations, em Chicago, disse que estava acostumado a ser despertado por vibrações de chamada inexistentes, e que era comum ler e enviar e-mails em seu BlackBerry no meio da noite. Ele diz que dormia mal, não se sentia renovado pela manhã e se via como viciado. “Queria garantir que aquilo que me aconteceu não acontecesse ao meu pessoal”, disse.
Assim, ele adotou uma norma de blecaute para os BlackBerrys de sua companhia; Chapman e os 20 funcionários da companhia mantêm seus celulares de trabalho desligados das 16h às 6h, nos dias de semana, e não os ligam nos finais de semana, a não ser em raras exceções. “Quando estou bem descansado, chego para trabalhar bem disposto, trabalho com dedicação e depois, no final do dia, paro e me torno um ser humano”, ele diz.
Chapman adota o mesmo regime ao viajar, e diz que a norma aumentou a produtividade de sua empresa.
Perlow concorda em que empresas podem se tornar mais lucrativas caso encorajem os funcionários a desconectar seus aparelhos eletrônicos, de vez em quando.
”Estar conectado constantemente na verdade prejudica a produtividade”, ela diz.
Mas isso nem sempre é fácil. Quando Michelle Barry, Mark Jacobsen e um terceiro sócio criaram uma companhia chamada Centric Brand Anthropology, uma consultoria de estratégia, design e gestão de cultura de marcas, em Seattle, eles dedicaram atenção ao assunto.
“Desde o começo, uma de nossas preocupações era manter um bom equilíbrio entre a vida profissional e a pessoal”, diz Jacobsen, vice-presidente e diretor de criação da Centric. “Mas encontramos muita dificuldade para manter essa atitude no trabalho com clientes multinacionais de grande porte”, que muitas vezes requerem viagens internacionais e disponibilidade constante.
E o fato de a companhia que eles criaram fosse nova também atrapalhava.
“Poder enviar um e-mail às duas da manhã não quer dizer que isso seja uma boa ideia”, ele diz.
A Centric encoraja seu pessoal a se preparar uma semana antes de cada viagem, designando um colega para substitui-los, informando os clientes da ausência, alertando que os contatos podem ser esporádicos e evitando estabelecer prazos de entrega muito próximos da data de retorno. Os funcionários também são encorajados a levar seus cônjuges ou parceiros afetivos com eles nas viagens mais longas, e a acumular folgas, diz Barry, a presidente-executiva da companhia. Ela diz que, quando viaja, “assumo o compromisso de não passar a noite acordada respondendo a e-mails”, e que dedica apenas 30 minutos a isso. Ela anota as ideias que tem fora do horário de expediente usando lápis e papel.
Os especialistas dizem que não existem dados claros quanto ao número de empresas que restringem o uso de eletrônicos por seu pessoal fora do expediente e do escritório.
“As empresas que conheço encorajam ativamente o seu pessoal a ficar conectado de noite e nos finais de semana”, diz Dennis Garritan, sócio diretor do Palmer Hill Capital, um fundo de capital privado, e professor adjunto na escola de administração de empresas de Harvard.
“Isso é visto como vantajoso para os dois lados”, ele diz. Os funcionários ficam informados quanto ao que está acontecendo e se sentem menos desinformados ao retornar ao escritório, e a empresa se beneficia porque os trabalhadores ficam mais envolvidos e são mais produtivos, mesmo fora do escritório.
Wayne Rivers, presidente do Family Business Institute, uma consultoria em Raleigh, na Carolina do Norte, diz que muitas empresas “preferem os funcionários que atendem telefonemas à uma da manhã”. Na maioria dos casos, “cabe ao trabalhador descobrir como equilibrar vida pessoal e profissional, e exercitar a disciplina necessária a evitar desgaste e esgotamento”.
Christopher Bennett, especialista sênior em transportes no Banco Mundial, que em 2012 passou cinco meses em viagens internacionais de trabalho, descobriu maneiras de enfrentar a questão.
“Há um motivo para que tenham sido apelidados de Crackberrys”, diz Bennett, que se recusou a aceitar o BlackBerry oferecido pelo seu empregador anos atrás. “O que descobri com meus colegas que usam o BlackBerry é que devido à pressão do trabalho, especialmente por lidarmos com fusos horários diferentes, eles verificam e respondem e-mails o tempo todo. Em casa. No jantar. Na academia. Nos finais de semana. Nunca se desconectam. Porque eu tenho uma personalidade obsessiva, preferi evitar isso”.
Stuart Fisher, diretor da divisão de pessoal e de combate ao estresse no trabalho do Banco Mundial, diz que embora a instituição não tenha normas oficiais de restrição ao uso de aparelhos eletrônicos fora da jornada de trabalho e que não tenha encontrado problemas por conta disso, observa a questão de um ponto de vista mais amplo, com relação ao equilíbrio saudável entre a vida pessoal e a profissional. Que os funcionários “dediquem tempo suficiente a eles mesmos” é um imperativo, ele escreveu em e-mail ao pessoal do banco.
Mas ele acrescentou que, em uma organização mundial, “acesso imediato ao pessoal tem importância crítica, não só para garantir o sucesso das diversas missões e projetos como para fins de proteção, já que nosso pessoal viaja a regiões austeras, distantes e potencialmente perigosas, nas áreas mais pobres do mundo”.
Sherry Turkle, professora de estudos sociais da ciência e tecnologia no Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT), diz acreditar que mais empresas venham a adotar esse tipo de política. “Estou otimista, porque creio que todo mundo esteja sentindo o aperto”, ela diz. Os trabalhadores estão ocupados demais respondendo a mensagens eletrônicas para que possam participar das conversações realmente importantes e necessárias ao negócio, diz.
“Não vou usar a metáfora do vício”, diz Turkle, que também é psicóloga. “Não vamos, e nem devemos, deixar os aparelhos de lado. É mais comparável à comida, e a cuidar da dieta digital. A questão que deveríamos propor é ‘quais são as escolhas saudáveis?’”
Essa é uma questão que Daniel Donovan, um advogado de Addison, Texas, que viaja constantemente a trabalho, diz ter considerado.
“Durante o dia, me mantenho perto do telefone, obsessivamente”, diz. “Verifico e-mails constantemente, contato o escritório o tempo todo. Sou louco como todo mundo”.
“Mas quando vou dormir, desligo o celular. Quando o dia de trabalho acaba, ele realmente acaba”, diz.
Tradução de PAULO MIGLIACCI
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