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domingo, 26 de maio de 2013


 Pará lidera em casos de trabalho escravo no País

O seminário “Da Senzala às Leis Atuais da CLT”, que marca a passagem dos 70 anos da Consolidação das Leis Trabalhistas no Tribunal Regional do Trabalho da 8ª Região (TRT8) teve na manhã desta quinta-feira, 16, uma apresentação do cenário atual do trabalho análogo à escravidão no Pará, feita pelos auditores fiscais do Trabalho Raimundo Barbosa da Silva e Gladys Nunes Vasconcelos, da Secretaria Regional de Trabalho e Emprego do Pará (SRTE/PA), do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE).
A palestra “Ações de combate à condição análoga à de escravo pela SRTE/PA” foi antecedida pelas considerações feitas pelos Desembargadores do Trabalho Herbert Tadeu Pereira de Matos e Sulamir Palmeira Monassa de Almeida, que falaram sobre como o problema do trabalho escravo continua e precisa ser combatido. Os auditores informaram que entre 1995 e 2012, no Pará, 12.463 trabalhadores foram libertados de condições análogas à escravidão. Em todo o Brasil, o número no mesmo período é de 44.139. Esse quadro deixa o Estado na condição de campeão do trabalho escravo em todo o País.
Raimundo Barbosa começou a apresentação mostrando os processos utilizados na escravidão moderna, identificados nas ações de fiscalização do MTE, que são bem diferentes dos grilhões que eram utilizados na colonização e no império brasileiros. “Não existem açoites, cangalhas e grilhões de quando a escravidão era legal e o escravo uma mercadoria”, disse Barbosa. Os métodos para suprimir a liberdade do trabalhador pobre e excluído são outros. “Na legislação não existe escravidão, mas os empregadores buscam formas dissimuladoras dessa prática, na tentativa de fugir das obrigações trabalhistas”, disse Barbosa.
Para isso, a arregimentação precisa ser feita em um local bem distante de onde o trabalho será feito. No caso do Pará, são trazidas pessoas de Estados como o Maranhão e o Piauí, pelo agenciador, chamado de “gato”, que vai até onde estão as pessoas vulneráveis pela sua condição econômica. O processo de cerceamento da liberdade começa no convencimento do trabalhador, a quem é oferecido um adiantamento em dinheiro, para deixar com sua família, o chamado “haver”. É o começo da dívida que o aprisionará. Logo, o trabalhador tem seus documentos recolhidos pelo “gato”, que o transporta a um lugar distante, no meio da floresta, onde ele costuma chegar à noite e de onde não saberá sair sem o transporte do empregador.
“Começa a se fechar uma cadeia de aprisionamento, que vai se fortalecer com o processo de dívidas contraídas, que é infindável”, explica Barbosa. Em alguns casos, os trabalhadores são levados a pensões, cuja dívida pela hospedagem só cresce, até que um aliciador chegue e “compre” o trabalhador, pagando sua dívida com a pensão ou hotel. No barracão, ele se endivida comprando alimentos e ferramentas. A comida é cara e de péssima qualidade. “Ao final, ele [o trabalhador] não tem dinheiro para pagar a dívida porque o que lhe foi prometido não cobre. E não pode sair porque não sabe onde está e não tem documentos”, completa Barbosa.
A auditora Gladys Nunes completou a apresentação mostrando fotografias das condições degradantes a que os trabalhadores escravizados são submetidos. De acordo com ela, a ética do homem simples do campo faz com que ele acredite mesmo em sua dívida e que não deve sair enquanto não pagá-la. Existe um sentimento de conformismo que é muito diferente da condição do trabalhador urbano, que já é informado sobre seus direitos e sabe procurá-los.
As moradias são feitas de troncos e cobertas de palha, com chão de terra batida, nas quais as redes e os pertences dos trabalhadores ficam pendurados. Fotos obtidas no município de Brasil Novo mostram alojamentos sem paredes, nos quais os trabalhadores dormem misturados: homens, mulheres e crianças, submetidos à chuva e ao frio. “Ao serem resgatados, eles se arrumam em minutos, pois têm quase nada”, revela Nunes.
Os alimentos – normalmente carne salgada, pois não há geladeiras - ficam pendurados ou acondicionados dentro de baldes sem higiene. Como são insuficientes para o trabalho pesado que desempenham, normalmente o “roço da juquira”, que consiste na preparação do terreno para o pasto -, os trabalhadores caçam o que podem, normalmente tatus. “A caça para complementar a alimentação é questão de sobrevivência. Muitas vezes eles passam fome”, disse Gladys Nunes. A água é a mesma que os animais bebem, de algum córrego ou de cacimbas. As necessidades fisiológicas são feitas no mato.
Gladys Nunes também revelou que já encontrou condições análogas à escravidão também no meio urbano em Belém, na construção civil, com trabalhadores sem registro, morando no local da obra e em péssimas condições sanitárias.
Ao final, Raimundo Barbosa fez a exposição da estrutura de que dispõe o Ministério do Trabalho para a fiscalização do trabalho escravo, sempre em parceria com o Ministério Público Federal (MPF), Polícia Federal (PF), Polícia Rodoviária Federal (PRF) e Batalhão de Polícia Ambiental (BPA), que costumam integrar os Grupos Móveis de fiscalização, que existem tanto na estrutura federal do MTE, quando em âmbito local, mas que ainda precisam de melhores condições estruturais.
Responsável: ASCOM